Sessenta e dois dias depois

NO DOMINGO SEGUINTE, dormi até a luz do final da manhã se
fragmentar na persiana e bater no meu rosto. Puxei o edredom sobre a cabeça,
mas o ar ficou quente e rançoso, então me levantei para ligar para os meus pais.
“Miles!”, minha mãe disse antes mesmo que eu pudesse lhe dizer um oi.
“Compramos um identificador de chamadas.”
“E, por acaso, ele é mágico para adivinhar que sou eu ligando do
telefone público?”
Ela riu. “Não, apenas diz ‘telefone público’ e o código da região. Então
deduzi. Como você está?”, ela perguntou, um tom caloroso de preocupação em
sua voz.
“Mais ou menos. Relaxei em algumas matérias por um tempo, mas já
voltei a estudar, então acho que vai ficar tudo bem”, eu disse, e isso em grande
parte era verdade.
“Sei que tem sido difícil para você querido”, ela disse. “Ah! Adivinha
quem eu e seu pai encontramos numa festa ontem à noite? A Sra. Forrester. Sua
professora de quarto ano! Está lembrado? Ela se lembrou direitinho de você, fez
muito elogios. Ficamos conversando” – e , embora eu tivesse ficado feliz em
saber que a Sra. Forrester admirava o Miles da quarta série, escutei sem prestar
muita atenção enquanto lia os recados rabiscados na parede branca em torno do
aparelho, procurando por novos recados para decodificar (Lacy’s – Sexta, 10 era
o onde e o quando de uma festa dos Guerreiros de Dia De Semana, imaginei) –
“então fomos jantar com os Johnston ontem à noite. Acho que seu pai bebeu
vinho demais. Brincamos de mimica e ele foi simplesmente horrível.” Ela riu, e
eu me senti cansado, mas alguém tinha empurrado o banco para longe do
telefone, então sentei no meu traseiro magro na dura superfície de concreto,
retesando o fio prateado. E estava me preparando para mais um solilóquio da
minha mãe, quando reparei que , embaixo de todos os outros recados e rabiscos,
havia uma florzinha desenhada. Doze pétalas oblongas em torno de um circulo
pintado de preto em contraste com a parede branca como... Margarida.
Margaridas brancas. Podia ouvir sua voz: O que você está vendo, Gordo? Preste
atenção, e eu a vi bêbada, sentada no chão perto do telefone, jogando conversa
fora com o Jake: Está fazendo o quê?, e ela: Nada, desenhando, desenhando.
Então, Meu Deus!
“Miles?”
“Oi, desculpa, mãe. Desculpa. O Chip está aqui. Vamos estudar. Preciso
ir.”
“Liga depois? Estou certa de que seu pai também quer falar com você.”
“Ligo, mãe; ligo, claro. Eu te amo, viu? Certo, preciso ir.“Acho que encontrei uma coisa!”, eu gritei para o Coronel, invisível
debaixo do cobertor, mas a urgência da minha voz e a perspectiva de termos
encontrado alguma coisa , qualquer coisa, fez o Coronel despertar imediatamente
e saltar da cama para o piso de linóleo. Antes que eu pudesse lhe explicar a
situação, ele pegou a calça jeans e o moletom do dia anterior, vestiu-se e saiu
comigo.
“Olha,” eu apontei. Ele se agachou ao lado do telefone e disse: “É. Foi
ela que fez. Ela gostava de desenhar flores assim.”
“E o ‘Nada, desenhando’, lembra? O Jake perguntou o que ela estava
fazendo e ela disse: ‘Nada, desenhando’, depois: ‘Meu Deus!’ e surtou. Deve ter
olhado para o desenho e se lembrado de alguma coisa.”
“Pode ser”, ele disse, olhando para as flores, talvez querendo enxergalas
como ela tinha enxergado. Então se levantou e disse: “É uma teoria muito
boa, Gordo”, ergueu o braço e deu um tapinha nas minhas costas, como um
treinador cumprimentando um jogador. “Mas ainda não sabemos o que ela
esqueceu.”

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