Capítulo 4

Ele está sentado na janela. Literalmente, sentado nela. Com seu traseiro no
peitoril da janela, e suas pernas - impossivelmente longas e torneadas - estão
penduradas do lado da casa, dois andares acima do chão. E suas mãos estavam
apoiadas no seu colo. É como se espionar sua vizinha fosse à coisa mais natural
do mundo.
Olho, impotente e perplexa, e ele explode em gargalhadas. Seu corpo treme e
ele joga a cabeça para trás e bate palmas.
Cricket Bell está rindo de mim. E ainda aplaude.
— Eu chamei seu nome. — Ele tenta parar de rir, mas sua boca fica cada vez
maior com o prazer. Eu consigo praticamente contar seus dentes. — Eu chamei
uma dúzia de vezes, mas sua música estava tão alta que eu resolvi esperar. Você
é uma boa dançarina.
A vergonha me tira a capacidade de ter uma conversa inteligente.
— Me desculpa. — Seu sorriso não desapareceu, mas ele visivelmente se
contorce. — Eu só queria dizer Olá.
Ele coloca as pernas para dentro de seu quarto em um movimento fluído. Há
uma leveza na maneira que ele aterrissa em seus pés, uma certa graça, que é
imediatamente reconhecível. E toma conta de mim uma vergonha dolorosa e
familiar. E então ele se estica, e eu fico surpresa de novo.
— Cricket, você está... Alto.
O que é, possivelmente, a coisa mais tola que eu poderia dizer pra ele.
Cricket Bell sempre foi mais alto que a maioria dos garotos, mas nos últimos
dois anos, ele cresceu 15 cm. Pelo menos... Seu corpo esbelto - que já foi
magrelo e desajeitado, apesar dos seus movimentos graciosos - também mudou.
Ele está mais cheio, só um pouco. Seus ângulos sumiram. Mas lembrar que
alguém é alto é como apontar o tempo quando está chovendo. Ambos óbvio e
irritante.
— É o cabelo — ele diz com a expressão séria. — A gravidade sempre foi
minha Nêmesis.
E seu cabelo escuro está longo. E desajeitado, meio que... O contrário de
desajeitado. Eu não tenho certeza de como é possível sem uma quantidade séria
de mousse ou gel. Mas até quando ele era criança, o cabelo de Cricket era
arrepiado pra cima. Isso lhe dá um ar de cientista louco, que não está tão distante
da realidade. Seu cabelo é uma das coisas que eu sempre gostei nele.
Até que eu não goste dele em nada. É isso.
Ele me esperou responder, e quando eu não o fiz, ele limpou sua garganta e
falou. — Mas você está mais alta também. Claro. Eu quero dizer... Já faz um
tempão. Então, é óbvio que você está. Mais alta.
Nós estamos nos avaliando. Minha mente gira tentando conectar o Cricket do
presente com o Cricket do passado. Ele está crescido e seu corpo cresceu, masainda é ele. O mesmo garoto que eu me apaixonei na nona série. Meus
sentimentos estão sendo construídos desde a nossa infância, mas aquele ano, o
ano que ele fez dezesseis anos, foi quando tudo mudou.
E a culpa foi dele nessas calças.
Cricket Bell sempre foi... Legal. E ele era fofo, e ele era inteligente, e ele era
mais velho, e era natural que eu nutrisse sentimentos por ele. Mas o dia que meu
mundo desabou foi o dia que eu descobri que ele tinha se interessado pela sua
aparência. Não de um jeito egoísta. Simplesmente de um jeito - talvez um short
largo e tênis gigantes não é o visual mais atraente para uma menina como eu.
Então, ele começou a usar estas calças
Belas calças. Nem calças modernas ou calças de mauricinho ou qualquer
coisa assim, apenas calças que diziam que ele se preocupava com as calças. Elas
foram escolhidas para se adequar ao seu corpo.
Algumas retas, algumas risca de giz que alonga ainda mais sua altura. E ele
as combina com camisas vintage e casacos incomuns de uma forma legal que
não parecia forçada.
Assim, enquanto os caras da minha sala mal conseguiam se lembrar de
manter seus zíperes fechados - os únicos que se preocupavam com a aparência
eram projeto de homossexuais - aqui estava um cara hetero perfeitamente
amigável, perfeitamente atraente, perfeitamente vestido que aconteceu
justamente de morar na porta do meu lado.
Claro que eu me apaixonei por ele. Claro que isso terminou mal.
E agora ele está aqui, eu seu modo de se vestir não mudou. Em nada, ele
melhorou. Ambos, suas calças e camisa ainda estão justas, mas agora ele tem
acessórios. Uma pulseira grossa de couro no pulso, uma infinidade de pulseiras e
elásticos coloridos no outro.
Cricket Bell parece bem. Ele parece estar muito melhor.
A compreensão disso é surpreendente, mas o que me espanta ainda mais é o
que está por vir.
Eu não estou mais apaixonada por ele.
Em vez disso, olhar pra ele fez com que eu me sentir... Vazia.
— Como vai? — Eu dei a ele um sorriso que era ao mesmo tempo quente e
frio. Um que eu espero que diga, eu não sou mais aquela pessoa. Você não me
magoou e eu nunca penso em você.
— Bem. Muito, muito bem. Eu acabei de iniciar em Berkeley. É onde minhas
coisas estão. Você sabe. Em Berkeley. Eu parei pra ajudar meus pais a desfazer
as malas. — Cricket apontou para trás como se as caixas estivessem logo ali. Ele
sempre falou com as mãos.
— Berkeley? — Estou chocada. — Como na...?
Ele olha para baixo para o beco entre as nossas casas. — Eu, uh, me formei
cedo. Escola em casa? Calliope fez, também, mas ela pulou essas coisas defaculdade por alguns anos para se concentrar em sua carreira.
— Você vai ficar aqui? — Eu pergunto com dificuldade de acreditar. — Em
um dormitório?
— Sim.
SIM. MEU DEUS, SIM!
— Quer dizer, eu vou trazer algumas coisas mais — ele diz. — Para fins de
semana e férias escolares. Ou o que quer que seja.
Meu peito se apertou. — Semanas?
— Provavelmente. Eu acho. — Ele parece pensativo. — Isso tudo é novo pra
mim. Sempre tem sido o desfile de Calliope, sabe?
Eu sei. A família Bell sempre esteve envolvida na carreira de Calliope. Essa
deve ser a primeira vez na vida de cricket que seus compromisso não giram em
torno dela.
— Eu a vi na TV no último ano. — eu digo, tentando não parecer angustiada
pela idéia de vê-lo regularmente. — Campeonato Mundial. Segundo lugar, é
impressionante.
— Ah. — Cricket encosta contra a moldura da sua janela. Ele coça o lado do
nariz e revela a mensagem escrita na parte de trás da sua mão esquerda:
CIRCUITO REVERSO. — Mas não deixe que ela te escute.
— Por que não? — Eu olho pra mão dele. É surreal. Ele sempre escreveu
lembretes codificados lá e sempre o mesmo marcador preto. Eu costumava
escreve na minha algumas vezes só pra parecer com ele. Meu estômago se
apertou com a lembrança. Ele percebeu? Será que Calliope o provocou sobre isso
que eu não estava por perto?
— Você conhece Cal. Não conta se não for o primeiro lugar.
Ele endireita-se, em movimento de novo, e estende as duas mãos na minha
direção. — Mas como você está? Sinto muito, eu monopolizei a conversa.
— Bem. Eu estou bem!
Eu estou bem? Dois anos de fantasias de vinganças e é assim que eu estou?
Claro que nos meus devaneios eu nunca estou usando pijamas combinando,
também.
Oh, não. Eu estou usando pijamas combinando.
E meu cabelo! Eu tenho uma peruca na cabeça! É totalmente lisa e suada!
Tudo neste momento está errado. Era pra eu estar vestindo algumas coisa
glamorosa e única. Nós deveríamos estar em uma sala cheia e eu roubaria seu ar
quando me visse. Eu iria rir e ele seria atraído pra mim como se fosse uma força
magnética. E eu estaria surpresa, mas não interessada em vê-lo. E, então, Max
apareceria. Colocaria seu braço em volta de mim. E eu partiria com a minha
dignidade recuperada, e Cricket seria deixado agonizando por que ele não me
quis quando teve a oportunidade.
Em vez disso, ele está olhando pra mim com uma expressão estranha. Suasobrancelha fez um vinco e sua boca está aberta, mas seu sorriso desapareceu. É
sua expressão de resolvendo-uma-equação-difícil. Por que ele está fazendo essa
cara de equação difícil?
— E sua família? — ele pergunta. — Como eles estão?
É irritante. Essa cara.
— Hum, eles estão bem. — Estou confiante e feliz. E sobre você. Não se
esqueça, eu passei por essa fase.
— Andy começou seu próprio negócio. Ele faz, e entrega aquelas tortas
deliciosas, de todos os sabores. Está indo bem. E Nathan é o mesmo. Você sabe.
Bem. — Eu olho pra longe, através da rua escura. Eu quero que ele pare de olhar
pra mim.
— E Norah? — Sua pergunta é cuidadosa. Delicada.
Um outro silêncio constrangedor. Muitas pessoas não sabem sobre Norah,
mas há certas coisas que não podem ser escondidas dos vizinhos. Coisas como a
minha mãe biológica.
—Ela é... Norah. Ela está no negócio de adivinhação agora, lendo folhas de
chá. — Meu rosto fica quente. Quanto tempo vamos ficar aqui sendo educados?
— Ela tem um apartamento.
— Isso é legal, Lola. Estou feliz em ouvir isso. — E porque ele é o Cricket, ele
parece feliz. Isso é tão estranho. — Você a vê com freqüência?
— Na verdade, não. Ainda não vi o Snoopy este ano. — Não tenho certeza
porque eu falei isso.
— Ele ainda está...?
Eu concordei. Seu nome verdadeiro é Jonathan Head, mas eu nunca ouvi
ninguém chamá-lo assim. Snoopy conheceu Norah quando eram adolescentes.
Ele também era alcoólatra, viciado em drogas e um mendigo degradado.
Quando ele engravidou Norah, ela veio até seu irmão mais velho pedir ajuda.
Nathan. Ela não me queria, mas também não queria abortar. E Nathan e Andy,
que estavam juntos há sete anos queriam uma criança. Eles me adotaram e
Andy mudou seu último nome pra Nathan para que todos tivéssemos o mesmo
nome.
Mas sim. Meu pai Nathan é biologicamente meu tio.
Meus pais tentaram ajudar Norah. Ela não estava vivendo nas ruas há anos -
antes de ter um apartamento, ela esteve com diversos grupos em casas - mas ela
não é exatamente uma pessoa confiável, eu sei. O melhor que posso dizer é que,
pelo menos ela está sóbria. E eu só vejo Snoopy de vez em quando, sempre que
ele passa na cidade. Ele vai telefonar aos meus pais, nós o levamos pra comer
um hambúrguer, e então não vamos ouvir falar dele por meses.
Os sem-teto se mudam mais do que a maioria das pessoas imaginam.
Eu não gosto de falar dos meus pais biológicos.
— Eu gosto do que você fez no seu quarto — Cricket fala de repente. —Asluzes estão bonitas. — Ele aponta para os fios de luzes brilhantes cor de rosa e
branco amarrados em meu teto. — E as cabeças de manequins.
Eu tenho prateleiras por toda a parte de cima das paredes do meu quarto,
alinhadas com cabeças de manequins turquesa. Elas são modelos das minhas
perucas e óculos. As próprias paredes estão cobertas com pôsteres de filme de
época e preto-e-brancos brilhantes de atrizes de clássicos. Minha mesa é cor de
rosa com glitter ouro, que eu joguei enquanto a tinta secava, e a superfície está
enterrada debaixo de frascos abertos de maquiagem brilhante, garrafas esmaltes
de unha meio seca, presilhas de plástico infantis e cílios postiços.
Na minha estante, eu tenho infinitas latas de tinta em spray e um monte de
bastões de cola quente e minha mesa de costura é toda colada com recortes de
revistas de moda de rua japonesa.
Fechos de tecido são empilhados de forma precária por cima, e na parede ao
lado tem prateleiras ainda mais cheias de frascos de vidro de botões, fios, agulhas
e zíperes. Sobre a minha cama, eu tenho um dossel feito de saris indianos e
guarda-chuvas de papel de Chinatown.
É caótico, mas eu amo isso, Meu quarto é meu santuário.
Eu olhei para o quarto de Cricket. Paredes lisas, chão liso. Vazio. Ele entendeu
meu olhar. — Não é mais como costumava. Não é? — Ele pergunta.
Antes de mudarem, era tão confuso quanto o meu. Latas de café cheia de
engrenagens e rodas quebradas e roscas e as argolas e parafusos. Esboços de
projetos gravados ao lado de quadros de estrela e da tabela periódica. Lâmpadas
e fios de cobre e relógios desmontados. E sempre a máquinas de Rube Goldberg.
Rube era famoso por desenhar as caricaturas de máquinas complexas que
executam tarefas simples. Você sabe, quando você puxar a corda para que a
bota chute sobre a canema, que libera a bola, que desembarca na pista, o que
rola na gangorra, que libera o martelo que desliga o interruptor de luz? Esse era o
quarto do Cricket.
Eu dou-lhe um sorriso cauteloso. — É um pouco diferente, CGB.
— Você lembra meio nome do meio? — Suas sobrancelhas levantaram em
surpresa.
— Não é fácil de esquecer, Cricket Graham Bell.
Sim. A família Bell é AQUELA família Bell. Como no telefone. Igual a uma
das mais importantes invenções da história
Ele esfrega a testa. — Meus pais me fizeram carregar esse nome infeliz.
— Por favor. — Deixei escapar uma risada. — Você costumava a se gabar
sobre isso o tempo todo.
— As coisas mudam. — Ele abre seus olhos azuis, como se estivesse
brincando, mas há algum plano por trás de sua expressão. É desconfortável.
Cricket sempre foi orgulhoso de seu nome de família. Como um inventor, assim
como seu tatara-tatara-tatara-avô, que era impossível para ele não ser.De repente, ele cambaleia para trás para as sombras de seu quarto. — Eu
deveria pegar o trem. Escola amanhã.
A ação me assusta. — Oh.
E então ele bloqueia a frente novamente, e seu rosto é iluminado por luzes
brilhante rosas e brancas. Seu rosto é difícil de ler. — Vejo você por aí?
O que mais posso dizer? Eu acenei na minha janela. — Estarei aqui.

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